Gestão de PMO

Cultura empresarial para o PMO ágil: O que é e como implantar?

Antes de implantar métodos ágeis, é preciso implantar uma cultura ágil. Métodos de gestão ágil possuem pouca efetividade em uma empresa que conserva a cultura corporativista.

Os resultados da abordagem ágil são limitados em um ambiente com uma cultura antagonista aos valores da cultura ágil.

O que é cultura organizacional?

A definição de cultura é:

Conjunto de tradições, crenças, atitudes e costumes que são cultivados por um determinado grupo social.”

Assim, conforme o grupo social, temos culturas em países, cidades, religiões, faixa etária, sexo, etc.

Portanto, a definição de cultura organizacional é:

Conjunto de tradições, crenças, atitudes e costumes que são cultivados pelas pessoas que fazem parte de uma organização.”

Um bom exemplo de traço cultural de uma determinada empresa, é como os profissionais agem quando se atrasam 10 minutos para o início da jornada de trabalho.

  • Em uma empresa que possui o traço da disciplina e pontualidade, o profissional se sente envergonhado e descontente pelo atraso.
  • Em uma empresa que não possui o traço da disciplina e pontualidade, o profissional não se sente descontente, sua atitude é de normalidade com o atraso.

Não importa se em ambas as empresas o horário de trabalho está escrito e claro em um documento no procedimento/estatuto da empresa, a expressão cultural está diferente.

Duas perguntas sobre a cultura mineira?

    • Como é a cultura mineira?
    • Onde a cultura mineira está escrita?

👉 Pergunta: Como é a cultura na empresa em que você trabalha? [responda aqui]

Gestão da estratégia versus gestão da cultura

Como você pode ver aqui, a gestão estratégica de uma empresa é um fator essencial para garantir o sucesso a médio e a longo prazo da organização. Os exemplos apresentados aqui são um excelente exemplo para isso.

Cabe uma pergunta interessante, o que é mais importante, a gestão da estratégia ou a gestão da cultura? Pare. Pense. Responda:

O que é mais importante, a gestão estratégica ou a gestão da cultura?

    • (  ) Gestão da estratégia
    • (  ) Gestão da cultura

Essa é uma pergunta importante para realizarmos a gestão de uma empresa. A resposta é clara e podemos apresentar ela ao analisar a capa de um dos livros do consultores em gestão Curt Coffman e Kathie Sorensen.

Culture Eats Strategy for Lunch
Culture Eats Strategy for Lunch

O livro, primeiramente publicado em 2013, tem como título uma frase primeiramente dita pelo consultor em gestão em gestão de Peter Drucker (1909-2005). Mais informações sobre o livro aqui.

No livro, entre outros pontos, os autores exploram evidencias de como a cultura da empresa tem maior impacto que as decisões estratégicas e como ela deve ser gerenciada assim como se gerencia estratégia.

A gestão estratégica, ainda que bem realizada, não se converte em ações práticas na empresa quando há divergências culturais.

Como gerenciar a cultura de uma empresa?

Não se gerencia cultura por meio de publicação de procedimentos e solicitação de leituras. São exemplos de ações para realizar a gestão da cultura de uma empresa:

  1. Definição e comunicação verbal por parte da alta liderança de qual é a cultura desejada
  2. Exemplo vindo da alta liderança da cultura desejada
  3. Troca de profissionais resistentes à nova cultura

Esse passo-a-passo aqui descrito é apenas uma síntese muito simples de um assunto bastante complexo (a inúmera quantidade de livros que buscam explicar isso é um indício da profundidade do tema, veja aqui).

Algumas empresas especializadas em gestão de pessoas, como a BTA, possuem métodos próprios e os utilizarão para gerenciar a cultura de grandes empresas, como a Localiza e a Gol (vide aqui).

Exemplo de ações para gerenciar a cultura empresarial

Engenheiros são excelentes em ações para gerenciar processos. Mas, infelizmente, são péssimos para gerenciar pessoas e cultura (estou falando isso com conhecimento de causa, eu sou engenheiro). Uma palavra que nunca ouvi durante 5 anos de graduação e 2 anos de mestrado em engenharia foi a palavra Cultura. Precisamos esclarecer alguns pontos aqui para que nós, humildes engenheiros, possamos compreender esse aspecto tão vital em qualquer grande organização.

Cada empresa possui a sua cultura característica. Algumas empresas possuem uma cultura tão peculiar ou característica que são reconhecida por elas.

  • Google: cultura percebida como alto incentivo a felicidade, e, a partir disso, obter alta produtividade e qualidade
  • Facebook: cultura percebida como alto incentivo a inovação
  • Ambev: Cultura percebida como alto incentivo a competição e “meritocracia”.

Ações de gestão de cultura dessas empresas podem ser percebidas pelas ações que apresentam-se a nos próximos 3 tópicos.

Gestão de cultura na Google

O Google oferece um plano de trabalho baseado em metas e objetivos e com horários flexíveis. Incentiva a prática de exercícios físicos por meio de disponibilização de espaços para práticas esportivas e liberdade para diferentes horários para pausas no trabalho. Incentiva alimentação saudável com refeitórios gratuitos e abertos a qualquer momento com diferentes pratos saudáveis disponíveis. Utiliza métricas de humor (no Brasil temos o feedz).

O filme The Intership é um boa referência de como a cultura da empresa é de fato voltada pelo trabalhar gostando de trabalhar (vide aqui). Sua gestão de cultura possui base científica em livros de consultores empresariais de Havard como Schaw Achor, que publicou partes dos seus estudos sobre o efeito da felicidade nos resultados de profissionais e estudantes no livro The Harvard Way to be Happy. Fruto desse trabalho, o Google foi eleito a melhor empresa para se trabalhar por 6 anos consecutivos (vide aqui).

Ambiente de trabalho de um escritório Google
Ambiente de trabalho de um escritório Google

Gestão de cultura no Facebook

O Facebook, atualmente com sede em um conjunto de prédios que pertenceu a Sun Microsystems, a placa da Sun Microsystems ainda está fixada na fachada, ela é usada nos treinamentos e comunicações da empresa como um lembrete de que empresas que deixam de ser inovadores perdem mercado e precisam fechar as portas ou ser vendidas para o concorrente.

Em outra ação, objetivando a melhoria do aplicativo Facebook para dispositivos portáteis, a equipe de desenvolvimento foi obrigada a usar o Facebook por um período usando somente a versão mobile do sistema até que as inovações promovidas no sistema os qualificassem ao nível de inovação buscado pela direção.

Centro de apoio à inovação do Facebook em São Paulo
Centro de apoio à inovação do Facebook em São Paulo

Gestão de cultura na Ambev

Na origem da Ambev, a cultura implantada era de competição extrema com bonificação para os premidos e bullying e demissões para os perdedores. Uma ação que ilustra isso, é a decisão de, a cada ano, 20% dos eleitos os melhores profissionais eram bonificados e os 10% piores eram demitidos (ainda que tenham desempenhado o seu papel com boa qualidade). Os traços competitivos permanecem atualmente mas com a eliminação das atitudes de abuso emocional como acontecia nos anos 90 e 2000 (vide reportagem aqui).

Outros méritos e deméritos a gestão da cultura da Ambev são apresentados no livro escrito pela jornalista Cristiane Correa, Sonho Grande (vide aqui, interessante o comentário do pablomatos).

Brasileiros donos da Ambev estão entre os mais ricos do mundo
Brasileiros donos da Ambev estão entre os mais ricos do mundo

A Ambev evoluiu sua cultura com ações anti-bullying, funcionários da empresa já foram demitidos por postagens preconceituosas em redes sociais (vide reportagem aqui). A cultura da Ambev divulgada atualmente é apresentada aqui.

O que é a cultura ágil

Podemos definir a cultura ágil como:

Conjunto de tradições, crenças e costumes que são cultivados pelos profissionais de uma empresa em acordo com os valores e princípios do manifesto ágil.”

Logo, precisamos então conhecer os valores e princípios do manifesto ágil. Eles são apresentados em:

Considerando que a abordagem ágil hoje extrapolou a indústria de desenvolvimento de software, podemos substituir a palavra Software no manifesto por Produto/resultado do projeto.

Cultura corporativista versus cultura ágil

Cada empresa possui a sua cultura. Vimos anteriormente que Google, Facebook e Ambev gerenciam a sua cultura de modos bem diferentes. Mas existe um conjunto de traços culturais presentes em grande parte das empresas e que dominava a cultura empresarial nos anos 90 que denominamos de cultura corporativista.

Os traços dessa cultura corporativista são:

  1. O locais de trabalho são feudos em que os executivos estão centrados em obter poder e crédito para si, e não em tomar as melhores decisões para a empresa;
  2. Os profissionais de diferentes departamentos competem por recursos entre si sem avaliar se de fato são o departamento mais carente do recurso;
  3. Profissionais pretendem fazer o seu desempenho parecer melhor que ao dos colegas de trabalho e não em de fato melhorar o desempenho da empresa como um todo;
  4. Chefes colocam competição entre seus liderados para que eles tentem agradar o chefe sob o receio de uma demissão e não tenham tempo para se focar em promoções que poderiam substituir o próprio chefe;
  5. Profissionais escondem informações e saberes da empresa para se fazer insubstituíveis ou serem amplamente vistos quando apresentam esse conhecimento em momento e situação oportuna.

Como você pode já ter percebido, esses traços culturais divergem dos valores e princípios da cultura ágil. A cultura corporativista dificulta a expressão dos seguintes traços da cultura ágil:

Colaboração e cooperação plena

  • Confiança
  • Trabalho em conjunto
  • Equipes auto-gerenciáveis (eliminação do papel de supervisor)
  • Transparência
  • Priorização da conversa face a face

Não adianta implantar uma abordagem de gestão ágil, ou um método de gestão ágil, em uma empresa corporativista, que a cultura ágil não florescerá e os resultados esperados não aconteceram.

A cultura ágil é pré-requisito para os frameworks ágeis

A implementação de frameworks (métodos, processos e procedimentos) de gestão ágil sem a empresa ter uma cultura ágil, se tornam apenas uma burocracia que não gera o retorno pretendido.

Só depois dos profissionais assimilarem os valores e princípios da abordagem ágil, podemos ter os resultados fantásticos atribuídos aos frameworks ágeis, conforme visualizamos na figura seguinte.

A transformação ágil se inicia na cultura e nos princípios ágeis
A transformação ágil se inicia na cultura e nos princípios ágeis

Sem a cultura ágil, os processos ágeis se tornam burocracias dispensáveis:

  • Sem o valor de colaboração, a prática do daily meeting do Scrum deixa de ser espaço para apresentar dificuldades e pedir ajuda para ser espaço para marketing pessoal do que a pessoa fez;
  • Sem o valor de equipe auto gerenciável, as reuniões de Sprint são reuniões de supervisão do que a equipe fez e não de fato e um estudo colaborativo de melhorias;
  • Sem o compartilhamento de informações estratégicas e financeiras do contrato, os Product Owners se tornam apenas comunicadores de status de andamento do projeto;
  • Sem o compartilhamento de informações estratégicas e financeiras do contrato, a equipe do projeto não pode exercer o alinhamento estratégico e autonomia do Scrum.

Algumas ações propostas por Jeff Sutherland para implantação do método Scrum, apresentam ainda mais divergências com a cultura corporativista.

  • Eliminação de medir o trabalho pelo tempo de trabalho: Foco no Resultado do trabalho. Eliminação da contabilização de horas e minutos de trabalho e até de pagamento de horas extras (ninguém deveria fazer hora extra);
  • Cultura totalmente colaborativa: Eliminação de limitação da função dos cargos (job description detalhado). Divergência com aspectos legais do trabalho no Brasil que podem caracterizar desvio de função;
  • Incentivo total ao desempenho da equipe: Incentivar colaboração ao extremo, eliminação de bonificações e incentivos para o heroísmo individual, o trabalho é feito sempre pela equipe;
  • Transparência total dos dados do projeto: Isso inclui transparência com o valor de remuneração de cada profissional. Aspecto visto como invasão de privacidade em algumas culturas empresariais no Brasil e visto como risco de pedidos de aumentos salariais por alguns empresários.

Esses e outros itens são apresentados em um dos livros que se tornou uma bibliografia base para os profissionais de gestão ágil: SCRUM: A arte de fazer o dobro do trabalho na metade do tempo.

Bibliografia sobre o método Scrum
Bibliografia sobre o método Scrum

Resistências na transformação da cultura corporativista para a cultura ágil

Quando um profissional é admitido em uma empresa, em geral, em questão de tempo, ele se adapta à nova cultura. Isso é bem ilustrado pelo filme The Devil Wears Prada (vide aqui). Mas quando pretendemos mudar a cultura da empresa (mudar o modus operandi de um grupo social), naturalmente encontramos resistências.

As resistências mais comuns para a implantação de uma cultura ágil consistem na resistência em compartilhar informações e dos profissionais de gestão operacional e na resistência de assumir uma postura multifuncional e de autogestão dos profissionais de gestão operacional e profissionais operacionais. De modo detalhado:

⚠ Profissionais da gestão estratégica e tática resistem em compartilhar informações tentando manter privilégios em seus cargos, dificultar promoções dos profissionais da baixa liderança, ter espaço e informações privilegiadas que permitam terceirizar culpados por fracassos e assumir para si resultados de sucessos. Querem manter o status quo de privilégios que cultura corporativista permite aos profissionais de gestão estratégica e manter a pirâmide estratégica da empresa verticalizada (com muitas posições de alta liderança) e não uma estrutura organizacional horizontalizada como é o objetivo das abordagens ágeis (com poucas posições de alta liderança e mais membros da equipe operacional com capacidades de auto-gestão).

⚠ Profissionais da gestão operacionais e profissionais operacionais resistem em serem multifuncionais. Acreditam que recebem um valor em dinheiro para fazer um trabalho para o qual foram contratados. Se eles fizeram esse trabalho para o que foram contratados, eles cumpriram o seu dever e nada mais lhe cabe ser exigido. Cabe a empresa contratar pessoas para que o trabalho novo, imprevisto ou desconhecido seja realizado. O profissional está na empresa para fazer o que lhe é pedido e que lhe esteja previsto. Não é o profissional quem deve procurar trabalho aleatoriamente. A função do trabalhador é fazer o que lhe é pedido.

A historieta da Maria que foi comprar abacaxi ilustra de modo didático esse fato.

Conclusão

Gerenciar a cultura da empresa é tão importante (ou mais importante) que realizar a gestão estratégica.

A implementação de abordagens e métodos ágeis só alcançam o pleno sucesso quando a empresa tem implantado uma cultura ágil.


Quiz de fixação

Assinale uma única alternativa para cada uma das perguntas a seguir e teste o seu aprendizado.

1) O que é cultura organizacional?

Correct! Wrong!

2) Sobre a relação entre gestão estratégica e gestão de cultura, qual das frases abaixo NÃO é verdadeira?

Correct! Wrong!

3) A cultura da empresa Ambev nos anos 90 estudada por diferentes gestores devido ao crescimento acelerado que a empresa obteve, e apresentada no livro 'Sonho Grande", é uma cultura corporativista em que PMO ágil não teria sustentabilidade. Qual dos "porques" abaixo NÃO justifica porque um PMO ágil não teria sustentabilidade na antiga cultura da Ambev?

Correct! Wrong!

4) Qual dos valores abaixo NÃO é um dos 4 valores da cultura ágil conforme apresentado no manifesto ágil?

Correct! Wrong!

Cultura empresarial para o PMO ágil
Excelente trabalho! Parabéns! Você entendeu muito bem os principais conceitos abordados!

Anderson Ferreira

Anderson Ferreira é engenheiro mecânico pela PUC Minas, MBA em gestão de projetos pela USP, certificado como PMP pelo Project Management Institute, Mestre em Engenharia pela UFMG e certificado PMO-CP pela PMO Global Alliance. Anderson ama a gestão de projetos e engenharia, e acredita que unindo esses dois conhecimentos podemos construir um Brasil cada vez melhor.

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